Na atividade policial não é incomum que policiais sejam intimados para comparecerem em juízo em período de férias ou, então, que chegue requisição para que o superior hierárquico os intime, quando estes já se encontram no gozo de férias.
O comparecimento em juízo para ser ouvido como testemunha é obrigatório, sempre que o policial for regularmente intimado, e o depoimento prestado em juízo constitui serviço público (art. 463 do CPC).
As férias são essenciais para qualquer trabalhador, mormente para os policiais que possuem um trabalho muitas vezes exaustivo, estressante e lidam diretamente com a criminalidade.
Visa-se com as férias o descanso e a manutenção da sanidade física e mental, ocasião em que o policial pode se desligar do trabalho e ter momentos dedicados, exclusivamente, à família ou para realizar outras atividades de interesse particular.
Em todos os casos, o policial deve manter uma forma que a administração possa contatá-lo, em caso de urgência e de excepcional interesse público, sendo possível que as férias sejam cassadas de forma motivada.
Nessas hipóteses em que o policial se encontra em gozo de férias e haja intimação para comparecer em juízo para ser ouvido em audiência criminal ou cível, deverá comparecer?
Em regra, não. Todavia, o policial não deverá tomar a decisão por iniciativa própria, devendo a administração oficiar o juiz competente e expor que o policial está de férias.
O juiz poderá adiar a audiência ou então mantê-la, oportunidade em que a parte que arrolou o policial como testemunha, que, geralmente, é o Ministério Público, decidirá se insiste na audição do policial após a colheita de provas em audiência.
Na prática, muitas vezes, o Ministério Público desiste da audição do ausente quando outros policiais presentes na audiência prestaram depoimentos suficientes para o esclarecimento dos fatos.
Caso o policial esteja de férias e na cidade em que reside, é razoável que compareça em juízo para ser ouvido, podendo a autoridade superior cassar esse dia de férias. O comparecimento em juízo para ser ouvido como testemunha, em razão do exercício das funções, constitui ato de serviço.
Caso o policial esteja de férias e viajando, não é razoável que compareça em juízo para ser ouvido. Deve o juiz adiar a audiência ou mantê-la para que a parte que arrolou a testemunha decida se insistirá na audição.
Não é razoável exigir que o policial que esteja viajando compareça em juízo, pois a regra para se ouvir testemunhas que não residem na cidade ou nas proximidades é a carta precatória. Portanto, em uma interpretação analógica, não é possível exigir que o policial que esteja de férias e viajando, ou com viagem programada para a data da audiência, compareça em juízo, sobretudo porque haverá desfalque econômico.
No âmbito da Polícia Militar de Minas Gerais, a Instrução Conjunta de Corregedorias n. 01/2014 prevê que o militar deverá ser intimado, ainda que de férias, para que compareça em juízo. Em caso de impossibilidade, o Comandante deverá oficiar juiz competente para que este adote as providências necessárias, como o reagendamento de audiência ou expedição de carta precatória (arts. 43 e 44).
Os Códigos de Processo Penal Comum e Militar[1] preveem a possibilidade de antecipação de audiência quando uma testemunha tiver que se ausentar de forma fundamentada, o que não impede, igualmente, a postergação da audiência.
Em se tratando de réu preso, deve o juiz envidar esforços para que a audiência seja antecipada e, se adiada, que seja marcada para a primeira oportunidade possível. Em se tratando de réu solto, naturalmente, a audiência será adiada.
Igualmente, o Código de Processo Civil (art. 449, parágrafo único) possibilita a ausência da testemunha em razão de motivo relevante, que a impeça de comparecer em juízo. Quando for possível prestar depoimento, nesses casos, o juiz designará, conforme as circunstâncias, dia, hora e lugar para inquiri-la.
O gozo de férias, por ser um direito constitucional e essencial para a sanidade física e mental do policial, constitui motivo relevante, que impossibilita o comparecimento em juízo, caso o policial esteja viajando.
Dessa forma, com fundamento no art. 225 do CPP, art. 363 do CPPM e art. 449, parágrafo único, do CPC, aliados à razoabilidade, boa-fé e dever de cooperação, o policial somente poderá ser obrigado a comparecer em juízo, nas férias, caso seja devidamente intimado e esteja na comarca em que será prestado o depoimento. É indevido exigir do policial que cancele viagens programadas ou que retorne para a comarca em que reside para ser ouvido em juízo.
De qualquer forma, para a colheita do depoimento da testemunha não é necessária a presença física, pois a lei permite a utilização de recursos tecnológicos de transmissão e recepção de sons e imagens em tempo real para a tomada do depoimento, o que poderá ocorrer durante a audiência de instrução e julgamento (art. 453, § 1º, do CPC e art. 222, § 3º, do CPP), sendo permitido, inclusive, que a acareação ocorra por videoconferência (art. 461, § 2º, do CPC).
Nota-se ser possível que o juiz ouça, durante a audiência de instrução e julgamento, o policial ausente fisicamente, por meio de chamada de vídeo por qualquer meio, como o whatsapp, zoom, FaceTime, sistema de videoconferência do CNJ, dentre outros. Em qualquer caso a audição deverá ser gravada e passar a compor os autos.
Tal prática deve ser fomentada, pois evita a redesignação de audiências e, consequentemente, concede uma maior celeridade processual a todos os processos, na medida em que um processo que seria postergado deixar de ocupar espaço na pauta de audiências, o que possibilita a designação de outra audiência que seria marcada para data mais distante.
Além da tomada de depoimentos por videoconferência contribuir para a celeridade processual, não só do processo em que ocorreu a videoconferência, contribui também com o descanso do policial que não terá que se deslocar, em seu horário de folga, para o fórum. Nesses casos, é possível ouvir o policial ainda que esteja de férias ou em licença médica, caso concordem, o que, geralmente, não ocorre quando é necessária a presença física.
NOTA
[1] Art. 225 do CPP e art. 363 do CPPM.